
Os polvos sempre foram vistos como os gênios solitários do oceano: mestres do disfarce, incrivelmente inteligentes, mas que viviam vidas isoladas. No entanto, uma descoberta espetacular no fundo do mar da Austrália virou essa ideia de cabeça para baixo. Cientistas encontraram uma verdadeira cidade subaquática de polvos, um assentamento complexo onde dezenas desses animais vivem juntos, constroem tocas, interagem, acasalam e até brigam com seus vizinhos.
Apelidada de “Octlantis”, esta comunidade agitada foi descoberta na Baía de Jervis e está reescrevendo os livros sobre o comportamento dos polvos. A pesquisa, liderada por cientistas como o professor David Scheel e publicada na revista Marine and Freshwater Behaviour and Physiology, usou câmeras subaquáticas para registrar mais de 10 horas de interações sociais complexas, provando que, sob as condições certas, esses animais podem ser surpreendentemente sociais.
Este artigo vai te levar em um mergulho profundo até Octlantis. Vamos explorar como esta cidade foi construída, como é a vida social de um polvo “urbano” e por que a descoberta de que eles podem viver em comunidade muda fundamentalmente nossa visão sobre essas criaturas misteriosas e fascinantes.
Octlantis: Uma Metrópole Feita de Conchas e Pedras
A cidade subaquática de polvos foi encontrada a cerca de 15 metros de profundidade e é centrada em um afloramento rochoso no fundo do mar. O que a torna uma “cidade” é que os polvos não estão apenas vivendo na mesma área; eles modificaram ativamente o ambiente para criar um lar. A área está repleta de “tocas” ou abrigos construídos pelos próprios polvos, usando pilhas de areia escavada e amontoados de conchas de vieiras e outros moluscos que eles comeram.
Essas pilhas de conchas, chamadas de “monturos”, funcionam como paredes de fortalezas improvisadas, protegendo as tocas de predadores e de vizinhos intrometidos. A cidade, que tem o tamanho aproximado de um ônibus, abriga cerca de 15 polvos da espécie Octopus tetricus, também conhecido como polvo-sombrio. Embora 15 possa não parecer muito, para uma espécie considerada solitária, é uma densidade populacional altíssima, uma verdadeira metrópole.
A descoberta de Octlantis em 2017 foi ainda mais impactante porque confirmou uma descoberta anterior, de 2009, de um local semelhante apelidado de “Octopolis”. Na época, muitos cientistas pensaram que Octopolis era uma anomalia. Encontrar uma segunda cidade prova que o comportamento social dos polvos não é um acidente, mas uma resposta real a certas condições ambientais.
A Vida Social de um Polvo: Interações, Acasalamento e Brigas
As câmeras deixadas em Octlantis revelaram uma vizinhança movimentada e, por vezes, dramática. Os polvos não estavam apenas coexistindo pacificamente; eles estavam constantemente interagindo. Os cientistas observaram rituais de acasalamento, comunicação através de mudanças de cor e textura da pele e, como em qualquer cidade movimentada, conflitos.
As brigas eram comuns. Um polvo tentava expulsar o outro de uma toca cobiçada, usando jatos de água e esticando seus tentáculos em uma exibição de força. Em um vídeo fascinante, um polvo estende um tentáculo para “cutucar” outro, que rapidamente muda de cor em sinal de irritação e se afasta. Essas interações, que variam de confrontos a simples sinalizações, mostram um nível de comunicação social que nunca havia sido associado aos polvos.
O professor Peter Godfrey-Smith, um dos filósofos da ciência que participou da pesquisa, descreveu a cena como assistir a uma “novela”. A vida na cidade subaquática de polvos é cheia de alianças, disputas por território e a busca constante por um parceiro. É a prova de que, mesmo para uma criatura com uma mente tão “alienígena”, as pressões da vida em comunidade podem levar a comportamentos que nos são surpreendentemente familiares.
Por que Eles Decidiram Viver Juntos?
Se os polvos são naturalmente solitários, o que os levou a fundar cidades? A resposta parece estar na combinação de dois fatores: comida abundante e falta de bons abrigos. A área ao redor de Octlantis é rica em vieiras e outros alimentos, o que significa que os polvos não precisam competir ferozmente por comida.
No entanto, o fundo do mar naquela região é, em sua maior parte, plano e arenoso, com poucos lugares para se esconder de predadores como tubarões e focas. O afloramento rochoso em que a cidade foi construída é como um oásis de segurança em um deserto perigoso. Parece que os polvos foram atraídos para este local seguro e, com tantos indivíduos se concentrando em uma área pequena, eles foram forçados a aprender a conviver.
Essa é uma ideia revolucionária, conhecida como a “hipótese do ponto de encontro”. Ela sugere que a sociabilidade pode evoluir em uma espécie solitária se o ambiente criar as condições certas. A inteligência dos polvos provavelmente desempenhou um papel crucial nisso, permitindo que eles se adaptassem e desenvolvessem regras sociais complexas para lidar com a vida em alta densidade.
Uma Mente “Alienígena” e um Coração Solitário? Talvez Não
A descoberta de Octlantis nos força a repensar a própria natureza dos polvos. Com seus três corações, sangue azul e um sistema nervoso distribuído por seus tentáculos, eles são frequentemente descritos como a coisa mais próxima de uma inteligência alienígena que encontraremos na Terra. Por muito tempo, essa “estranheza” foi associada à sua solidão.
Mas a cidade subaquática de polvos nos mostra que, apesar de sua biologia única, eles podem enfrentar os mesmos desafios sociais que os animais “convencionais”. A necessidade de encontrar um parceiro, defender um lar e negociar com os vizinhos pode ter impulsionado a evolução de um comportamento social que estava escondido sob a superfície.
Para o mergulhador e naturalista amador que descobriu o local original, Matthew Lawrence, a observação foi um momento de pura admiração. “Você não espera ver isso. Você espera ver um polvo solitário em sua toca. Ver tantos deles interagindo, foi como encontrar uma cidade perdida”, ele relatou. Sua descoberta, seguida pela confirmação científica, abriu uma nova e empolgante fronteira na nossa compreensão de uma das criaturas mais inteligentes e misteriosas do planeta.
A existência de Octlantis e Octopolis prova que ainda temos muito a aprender sobre a vida nos oceanos. Os polvos, que já nos fascinavam com sua inteligência individual, agora nos mostram que também são capazes de criar sociedades. A cidade subaquática de polvos é um lembrete de que a vida encontra maneiras complexas e surpreendentes de se organizar, e que as mentes mais brilhantes do nosso planeta podem estar escondidas onde menos esperamos.
Onde fica a cidade de polvos?
A principal cidade descoberta, apelidada de “Octlantis”, está localizada na Baía de Jervis, na costa da Austrália, a cerca de 15 metros de profundidade.
Os polvos são animais sociais ou solitários?
Tradicionalmente, os polvos são considerados animais solitários. A descoberta de cidades como Octlantis mostra que, sob certas condições (comida abundante e abrigos limitados), eles podem viver em comunidades densas e desenvolver comportamentos sociais complexos.
Como os polvos constroem suas “casas”?
Eles escavam tocas na areia e usam pilhas de conchas de suas presas (como vieiras) para construir paredes e barricadas, criando abrigos protegidos.
Os polvos interagem entre si na cidade?
Sim. As câmeras registraram uma variedade de interações, incluindo comunicação por mudança de cor, rituais de acasalamento e até confrontos e brigas por território.
Por que essa descoberta é tão importante?
Ela desafia a ideia de longa data de que os polvos são estritamente solitários. Isso sugere que sua alta inteligência lhes permite uma flexibilidade de comportamento muito maior do que se pensava, adaptando-se para viver em sociedade quando o ambiente o exige.

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