
No coração do que hoje é o Iraque, entre os rios Tigre e Eufrates, floresceu a primeira civilização do mundo: a Suméria. Há mais de 6.000 anos, eles nos deram a escrita, a roda, as cidades e as leis. Mas uma série de artefatos e interpretações controversas sugere que eles podem ter nos deixado algo ainda mais chocante: o conhecimento de que o Sol, e não a Terra, era o centro do nosso sistema solar. Se for verdade, seria uma revelação que reescreveria a história da ciência, colocando-os milênios à frente de Copérnico e Galileu.
A ideia parece pertencer à ficção científica. Como um povo da Idade do Bronze, munido apenas de seus olhos e de uma matemática engenhosa, poderia ter desvendado um dos segredos mais fundamentais do cosmos? A teoria é alimentada por selos de argila e textos cuneiformes que, para alguns, mostram um conhecimento astronômico impossivelmente avançado. Este é um mergulho em um dos maiores mistérios da antiguidade: os sumérios eram apenas observadores brilhantes do céu, ou eles sabiam de algo que o resto do mundo levaria milênios para redescobrir?
Os verdadeiros astrônomos da antiguidade
Antes de mergulhar na polêmica, é preciso deixar uma coisa clara: os sumérios e seus sucessores, os babilônios, eram astrônomos geniais. Ninguém contesta isso. Eles foram os primeiros a mapear o céu noturno de forma sistemática. Foram eles que dividiram o ano em 12 meses, a semana em 7 dias e o dia em 24 horas. Eles criaram o zodíaco, mapeando a trajetória do Sol através das constelações, um sistema que usamos até hoje na astrologia.
Usando seus zigurates como observatórios, eles rastrearam o movimento dos planetas visíveis a olho nu, especialmente Vênus, com uma precisão assustadora. Eles desenvolveram uma matemática complexa, de base 60, que lhes permitia prever eclipses lunares e solares. O conhecimento deles era tão avançado que formou a base sobre a qual a astronomia grega, e mais tarde a europeia, foi construída. Eles eram, sem dúvida, os pais da observação astronômica.
A polêmica tábua que ‘muda tudo’
O centro de toda a controvérsia sobre um sistema solar heliocêntrico sumério gira em torno de um pequeno objeto: um selo cilíndrico de 4.500 anos, conhecido como VA 243. O selo, que está em um museu em Berlim, mostra várias figuras e, o mais importante, um desenho no canto superior esquerdo. Ali, vemos o que parece ser uma grande estrela no centro, cercada por onze corpos celestes menores, de tamanhos variados.
Para teóricos como o autor Zecharia Sitchin, essa imagem é uma representação clara do nosso sistema solar. A estrela central seria o Sol, e os corpos ao redor seriam os planetas, incluindo a Terra, a Lua e até mesmo Plutão (que só descobrimos em 1930) e um suposto planeta desconhecido chamado Nibiru. Se essa interpretação estiver correta, significaria que os sumérios tinham um conhecimento completo e preciso da nossa vizinhança cósmica, algo que seria impossível sem telescópios avançados.

O que os especialistas realmente dizem
No entanto, a grande maioria dos historiadores, arqueólogos e assiriólogos (especialistas em culturas mesopotâmicas) discorda veementemente dessa interpretação. Para eles, a teoria do sistema solar no selo VA 243 é um caso clássico de ver o que se quer ver. Primeiro, não há absolutamente nenhum texto sumério ou babilônico que descreva um sistema heliocêntrico. Todos os seus escritos sobre cosmologia descrevem uma Terra plana no centro de tudo, com o céu sendo uma cúpula sobre ela.
Então, o que o selo realmente mostra? A interpretação acadêmica mais aceita é que a imagem não é o sistema solar, mas sim uma representação simbólica. O corpo central é uma estrela, que poderia ou não ser o Sol, e os pontos ao redor são outras estrelas. Uma das teorias mais fortes é que o desenho representa a constelação das Plêiades, um aglomerado de estrelas muito importante em várias culturas antigas, incluindo a mesopotâmica. Os símbolos ao redor não seriam planetas, mas simplesmente outras estrelas no céu.
A verdade sobre a visão de mundo suméria
A realidade é que, embora fossem observadores meticulosos, os sumérios não tinham o conceito de um sistema solar como o nosso. Sua genialidade estava em prever os padrões dos movimentos celestes, não em entender a física por trás deles. Para eles, os planetas eram deuses ou estrelas errantes, e seus movimentos eram vistos como presságios que influenciavam a vida na Terra. A ideia de que a Terra era apenas mais um planeta girando em torno de uma estrela estava completamente fora de sua visão de mundo.
O modelo heliocêntrico só foi proposto pela primeira vez de forma documentada pelo astrônomo grego Aristarco de Samos, cerca de 2.000 anos depois dos sumérios, mas sua ideia foi rejeitada na época. Foi somente no século 16, com Nicolau Copérnico, que a teoria heliocêntrica começou a ser aceita pela ciência. Atribuir esse conhecimento aos sumérios, embora seja uma ideia romântica, não é apoiado por nenhuma evidência histórica sólida.
Um legado ainda mais impressionante
A verdade sobre a astronomia suméria é, de certa forma, ainda mais impressionante do o mito. Eles não precisaram de um mapa perfeito do sistema solar para se tornarem os primeiros cientistas do céu. Com paciência, matemática e observação contínua, geração após geração, eles decodificaram os ritmos do cosmos e criaram a própria fundação da astronomia. O seu verdadeiro legado não é um segredo perdido sobre o Sol, mas o presente duradouro da observação sistemática, um presente que, eventualmente, permitiu que Copérnico e Galileu nos mostrassem nosso verdadeiro lugar no universo.